sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Moradores de rua se queixam de falta de assistência


Romilzo, morador de rua
Romilzo é um dos moradores que engrossa as estatísticas no Rio
Estima-se que cerca de dez mil pessoas vivam nas ruas do Estado do Rio de Janeiro, mas não há estatísticas precisas, pela própria natureza móvel dessa população, nem uma política do governo para resolver o problema de forma permanente.

Muitas dessas pessoas se queixam da falta de assistência. É o caso de Leonardo, 26 anos, que vive nas ruas desde os 7, quando veio da Bahia para o Rio de Janeiro depois da morte dos pais.

“O Estado não quer nada com a gente”, diz Leonardo, que ao chegar ao Rio foi morar com uma tia, que o colocou num colégio interno, e acabou fugindo.

“O que eu queria era uma oportunidade de emprego, uma pessoa que acreditasse em mim, me desse uma esperança, um apoio. (Que) acreditasse que a gente vai mudar, porque eu acredito que eu mudo, mas eu dependo também das outras pessoas acreditarem. Ninguém vive sozinho.”

Pouco contato

“Pode parecer uma perspectiva simplista posta deste jeito, mas a população de rua não vota, em princípio”, diz o sociólogo Dario Souza e Silva, autor de uma pesquisa sobre moradores de rua no Rio de Janeiro.

“Eles não são um grupo social politicamente organizado, eles não se representam, são representados exteriormente por alguém que os conduz, que se diz seu representante”, diz ele.

Geralmente, o pouco contato que os moradores de rua têm com o Estado ocorre quando são deslocados de um lugar para o outro, quando vão para centros de triagem e albergues, ou quando entram em confronto com a polícia.

“Os moradores de rua são mais comumente vistos pela opinião pública como um problema. Não aparecem como uma prioridade de políticos em geral, salvo quando associados a uma perspectiva mais assistencialista, porque eles são vistos pela população como um problema, uma coisa associada à violência, à pobreza… falsamente associada à violência”, diz Dario.

“São ex-trabalhadores formais, da construção civil ou de serviços domésticos, que não conseguiram inclusão no mercado de trabalho, ou foram expulsos dele (por conta da perda de vitalidade econômica do Rio de Janeiro nas últimas décadas). Mas não são pessoas que estão, no seu geral, há muito tempo na rua.”

Brigas

Muitos deles foram parar na rua depois de terem sido expulsos das favelas pelo alto custo da moradia, diz Dario, mas a maioria saiu de casa por conta de desavenças.

Wilson Salustiano é um desses exemplos. Ele saiu de casa há três anos por conta de uma briga de família e foi morar nas ruas.

Todos nós sentimos preconceito nas ruas. A gente dorme, não sabe se vai acordar. A gente dorme com um cobertor, não sabe se vai acordar com aquele cobertor.
Wilson Salustiano, morador de rua

Ele conta que não faz nada e vive da caridade alheia, mas, apesar disso, já enfrentou problemas com a polícia.

“Eles vêm e espancam mesmo. Não sei por quê. Acho que é recalque, eles vêem uma pessoa negra, que mora na rua…”

Wilson conta que o mais difícil de morar nas ruas é não poder confiar nas pessoas.

“Todos nós sentimos preconceito nas ruas. A gente dorme, não sabe se vai acordar. A gente dorme com um cobertor, não sabe se vai acordar com aquele cobertor. A história é essa”, diz ele.

Documentação

Esta população, cada vez mais, se afasta da vida “formal”.

Muitos não têm documentos e a grande maioria não tem acesso a serviços públicos básicos.

“Temos uma carência geral na oferta de serviços públicos. Os serviços públicos de saúde, educação e mesmo de segurança são extremamente precários para os segmentos mais pobres, aqueles que não têm outro recurso senão este”, explica Dario.

“Este grupo de pessoas está em competição por esses serviços com outras pessoas também muito pobres, mas que não estão nas ruas”, afirma o sociólogo.

Hoje em dia, pelo menos, não é mais preciso ter uma referência de endereço para ter acesso a programas de transferência de renda como o Bolsa Família. Mas ainda não há uma estimativa de quantos recebem este – ou outros – benefícios do governo, apesar de muitos terem direito.

Também se fala bastante ultimamente das três gerações de rua. “São pessoas que vieram para as ruas, tiveram filhos e seus filhos tiveram, precocemente, filhos. Então, há três gerações, há pessoas que nunca foram registradas oficialmente, que não têm sobrenome”, diz o sociólogo.

“Isso não é um contingente enorme, mas a simples ocorrência já é uma coisa alarmante, significa que essas pessoas romperam o vínculo com o que a gente pode chamar de Estado nação. Eles romperam o vínculo com o país, vivem dentro dele, mas não têm comunicação com as instituições.”

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